Fatos e crendices sobre o raio
Ângelo Paes de Camargo
Geralmente se admite que a faísca elétrica é qualquer coisa que sempre desce das nuvens para atingir objetos e pessoas na superfície da terra. Todavia, sabe-se hoje que essa descarga elétrica, ou o raio, poderá também seguir caminho inverso, subindo do solo para alcançar as nuvens. Na verdade, são os fluxos elétricos ascendentes os responsáveis pela maior parte dos casos em que esse meteoro assume caráter grave, causando acidentes tão temidos.
Outro aspecto geralmente aceito como verdadeiro, mas cujas observações não autorizam confirmação é que o raio não incide mais de uma vez no mesmo lugar. Entretanto, as estatísticas revelam que o edifício Empire State, de Nova Iorque, é atingido pelas faíscas elétricas umas cinqüenta vezes por ano e, naturalmente, sem conseqüências, por estar bem protegido.
Um dos lugares mais seguros para abrigar-se durante as tempestades elétricas é o interior dos automóveis de carroceria metálica. Se um destes veículos for atingido por uma faísca, sua armadura metálica impedirá que a corrente elétrica penetre em seu interior e afete seus ocupantes. Da mesma forma, se o raio incidir um aeroplano metálico, como são os aparelhos modernos, os passageiros escaparão incólumes. Não são os raios que atemorizam os aviadores, nas tempestades, mas as violentas correntes aéreas.
Efeito protetor comparável aos dos veículos metálicos é o que se obtém com sistemas de pára-raios e cabos metálicos com que se envolvem os edifícios elevados. Sendo as estruturas metálicas excelentes condutos de eletricidade, as faíscas são por elas desviadas para o exterior ou para o solo sem afetarem os edifícios.
A temperatura da faísca elétrica é elevadíssima, da ordem de 15.000 ºC, ou mesmo mais, podendo, portanto, com facilidade, fundir os corpos que encontra em sua passagem.
O estrondo produzido pelo raio, ou seja, o trovão, é causado pelo estilhaçamento dos átomos e moléculas de ar, pela passagem violenta e rapidíssima do fluxo elétrico. Todavia, somente quando a faísca ocorre não muito distante é que o ruído se mostra bastante forte e ressonante. Quando provém de vários quilômetros de distância, o ruído mostra-se abafado e rouco. Além de trinta quilômetros de distância, o trovão já não é mais ouvido. Há raios que não produzem ruídos. Isto se dá quando são lentos e não chegam a arrebentar as moléculas e átomos à sua passagem.
Quando o raio atinge uma pessoa, o faz instantaneamente. Se não causar sua morte, deixando-a apenas paralisada, poderá a vítima ser salva por meio da respiração artificial. Quando uma corrente de alta voltagem, como a faísca do raio, passa através do corpo animal, causa geralmente a paralisação dos nervos e músculos que controlam a respiração. Por isso, a respiração artificial se torna imprescindível, até que o efeito paralisante do raio desapareça. A vítima da faísca elétrica normalmente sofre também queimaduras, mas seu curativo pode ficar para mais tarde. O importante é não deixá-la morrer asfixiada por falta de respiração.
Muitos dos acidentes das descargas elétricas poderiam ser evitados com a obediência de algumas poucas regras de segurança como: permanacer durante as tempestades elétricas no interior de edifícios; afastar-se de praias e campos abertos; não nadar, não andar a cavalo, nem de bicicleta ou em qualquer outro veículo aberto, como tratores e automóveis sem capotas metálicas; afastar-se dos cumes dos morros e das proximidades de árvores altas isoladas, que são bastante perigosas, não só pela faísca elétrica em si, mas porque a árvore poderá cair, vindo a atingir a pessoa; evitar o contato e mesmo a proximidade de cercas de arame e outros objetos metálicos não ligados à terra.
Os efeitos das descargas elétricas não são, todavia, sempre danosos. Elas provocam a síntese, na atmosfera, de grandes quantidades de valiosos adubos azotados, os quais, alcançando a superfície da terra, por intermédio das chuvas, vêm beneficiar indiretamente a agricultura.
(Camargo, Ângelo Paes de. "Fatos e crendices sobre o raio". O Estado de
São Paulo. São Paulo, 10 de junho de 1959)
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